quinta-feira, 6 de julho de 2006

Artigo

DANDO UMA DURA EM NÓS MESMOS
Glauco Fonseca

Quem lê jornal, ouve rádio e assiste televisão, quem acessa Internet, lê blogs, manda e recebe e-mails, está mais por dentro do que está acontecendo no Brasil ex-Copa do Mundo. Eu, você, meu amigo Badanha e a vó dele sabemos das coisas podres que acontecem porque entendemos muito de mídia, mas não sabemos nada de povo.

É do meu amigo Badanha a frase “o voto do Gerdau é igual ao do Nhô Blau”. Ele só não é um brilhante frasista porque só fez essa, mas a frase é tão iluminada que exprime um modus vivendi do qual não conseguimos nos aproximar e conhecer, que é uma maneira de viver sem informação, sem opinião e quase sem qualquer outro interesse que não seja futebol, novela e religião.

O problema é que nós lemos o que escrevemos e escrevemos para quem lê. Nossa manifestação escrita é desproporcional ao recado que queremos dar. Em outras palavras, ao avisarmos que um novo mandato de Lula será ruim para o país, haja vista a roubalheira e a impunidade da enorme quadrilha que tomou o país de assalto, estamos sussurrando para nós mesmos, através de mecanismos, que Nhô Blau não quer nem tomar conhecimento que elas existem. Dá para comparar com uma campanha publicitária que deseja triplicar vendas com apenas um comercial de rádio, à noite, num sábado.

Outro fator do qual nada entendemos é tempo. Se levarmos em conta que Lula levou 15 anos entre a primeira eleição presidencial livre e direta até sua posse, já deveríamos ter em mente que as coisas levam tempo. O processo de comunicação, emissão e recepção, não funciona como o modem de nossa privilegiada conexão Internet banda larga. A mensagem é enviada e o retorno é tal qual um eco que pode ser medido às vezes em segundos, às vezes em anos. Lula teve seu eco recebido após longos anos, fora o silêncio das derrotas.

Enquanto isso, nós ficamos escrevendo artigos, postando notas, publicando ou fazendo coro a denúncias para... nós mesmos! O governo corrupto que queremos escancarar investe centenas de milhões em propaganda em rádio popular, em pôster de repartição de cidade do interior, em carro de som, faturando muito mais alto em votos do que conseguem iluminados escribas ou simples blogueiros (como eu).

Nós não somos capazes de montar militância, de criar brigadas indignadas de agentes multiplicadores. O PT é. E o maior exemplo disso foi Porto Alegre, onde o governo municipal do PT sempre foi medíocre e o que passou foi uma idéia de vanguarda, de modernidade, de qualidade de vida. Durante as edições do Fórum Social Mundial, a administração petista tirava os moradores debaixo das pontes do putrefato Arroio Dilúvio, trancafiava os meninos e meninas de rua em suas vilas e só mostrava uma cidade que nós, porto-alegrenses, desconhecíamos nos outros 350 e poucos dias do ano restantes.

Resta-nos continuar a escrever, comentar, publicar, denunciar, reclamar e escrever de novo. Não é do nosso feitio pintar faixas e conclamarmos multidões em passeatas. Nossos amigos, nossa “network” continuará nos lendo e nós continuaremos escrevendo e lendo e mandando para a mesma rede. É pouco, mas já é algo.

Resta também a torcida de que eles continuem a roubar, prevaricar, corromper. Um dia, quem sabe, as coisas podem mudar. Vai que Nhô Blau decida ler a parte do jornal que fale de política – ou de polícia – e aí eles já eram.

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