domingo, 10 de setembro de 2006

Artigo

OS SERVO-INTELECTUAIS
por Denis Rosenfield, filósofo


É propriamente surpreendente o manifesto de 213 intelectuais de apoio a Lula, não fosse o fato de serem reincidentes no apoio indiscriminado ao PT. Trata-se, na verdade, de intelectuais a serviço da “causa” socialista, encobrindo qualquer “erro”, “falta”, “deslize”, “corrupção” ou “crime” em nome da máxima: “os fins justificam os meios”. O que caracteriza a sua ação não é o que deveria ser a função primeira dos intelectuais, a busca da verdade, mas a justificativa de qualquer ação de seu partido ou de seu líder. A moralidade é, assim, relativizada em proveito daquilo que a direção partidária e o seu líder maior consideram como sendo o “bem”, no caso, a corrupção leninista como sendo esse “bem maior”. São os traidores da verdade.

O PT e seus intelectuais, antanho, em época que hoje parece remota embora seja próxima temporalmente, se diziam “puros”, os autênticos representantes da ética na política. Graças a esse produto que conseguiram vender para a população brasileira, conquistaram a sua simpatia, capturaram progressivamente mais votos e chegaram à presidência da república. E digo bem vender a idéia como se vende um produto qualquer, com a especificidade que os vendedores não acreditavam minimamente em seu produto, na verdade, uma mercadoria política usada simplesmente para a conquista do poder.

Acontece que a mercadoria em questão foi comprada por seu valor de face, pois toda a sociedade passou a acreditar em que a sua validade seria perene. À sua luz, outros partidos foram julgados – e condenados -, pois a sua ação não se inscrevia naquilo que os puros consideravam como sendo o bem. Uma parte considerável da intelectualidade brasileira começou a navegar nessas águas, tendo como piloto um partido que encarnava o que deveria ser uma sociedade perfeita. Começaram, ao mesmo tempo, a perder a sua capacidade de julgar, a independência do pensamento, tornando-se meros servos desses novos senhores. O stalinismo era objeto de crítica quase unânime, mas nem essa crítica era verdadeira, pois somente velava um comportamento dogmático, também ele baseado no marxismo vulgar, o mesmo que continua orientando a manifestação dos artistas e, agora, esse manifesto de servo-intelectuais.

O seu exemplo mais acabado é a dita filósofa Marilena Chauí, a que não cansa de repetir que Lula seria meramente objeto de “preconceitos de classe” ou, em outras manifestações, de uma armação da “direita” ou das “elites”. O silêncio dos intelectuais se torna o silêncio diante da corrupção e dos crimes que têm caracterizado esses quatros anos de governo Lula e de hegemonia petista. A cúpula do governo foi dizimada, os auxiliares mais diretos do Presidente foram obrigados a renunciar pelo acúmulo de denúncias contra eles, sendo o caso paradigmático o do ex-Ministro Chefe da Casa Civil, José Dirceu, que teve seu mandato cassado e foi denunciado pelo Procurador-Geral da República como o chefe de uma “sofisticada quadrilha”. O que diz a intelectual petista? Nada. O silêncio mais vergonhoso. A cúpula petista renúncia na maior crise partidária, decorrente do desvio de recursos públicos, da formação de quadrilha, de assalto ao Estado, numa espantosa sucessão de fatos, que deixaria qualquer um, pelo menos, corado. O que diz a intelectual petista? Nada. O silêncio mais sepulcral. Se algo é dito, a culpa, evidentemente, é do “capitalismo”! Um monstro tão assombroso que conseguiu inclusive devorar as belas almas desses militantes partidários e desses servo-intelectuais.

Jamais a república tinha visto tal sucessão de fatos escabrosos a serviço de um partido que não hesita diante de nenhum meio. Não se trata, evidentemente, de dizer que a corrupção não existia antes, o que seria um completo contra-senso. Trata-se, somente, de ressaltar o caráter específico dessa nova forma de corrupção, a serviço de um projeto partidário, que considera o Estado algo a ser apropriado por eles. Um Estado aparelhado e posto a serviço de uma ideologia autoritária, senão, no extremo, totalitária. Se antes os ladrões e corruptos, pegos, tinham vergonha ou aparentavam tê-la pelo uso privado que faziam dos recursos públicos, o caso, agora, muda de figura, pois os corruptos crêem que bem fizeram, visto que seguiram os cânones partidários. E para que esses corruptos-militantes não fiquem sós, na solidão de uma culpa que poderia eventualmente aparecer, os seus companheiros-intelectuais surgem em seu auxílio: crimes não são crimes, mas atos que servem à causa. Os críticos, os que defendem a moralidade pública, são representantes de uma direita que unicamente age segundo “preconceitos de classe”. Viva o dogma, viva a servidão!

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