sábado, 13 de janeiro de 2007

Artigo

Tens visto o fulano?
Luiz Carlos Prates
(DC - 04/01/2007)

Festa de fim de ano, cidade gaúcha, colegas do curso médico que não se viam há bom tempo. Alguns não se viam desde que terminaram a faculdade, coisa de uns 20 anos. Abraços, sorrisos, afagos nas barrigas, saudades, lembranças. E, claro, as perguntas de sempre: - E o fulano, tens sabido dele?

À esta pergunta uma resposta quase sempre por igual: - "Ah, o fulano está muito bem, a última vez que o vi estava de viagem marcada para a Europa, mora numa mansão, tem uma clínica muito concorrida." Se é feliz ninguém pergunta.

Ser um sucesso no mundinho de hoje é ter matérias acumuladas, o resto não conta e ninguém quer. O que conta é morar numa mansão, dirigir um carro caro, ter filhos na Disney... essas bobagens que, não raro, enfartam. Onde quero chegar? Já digo. Primeiro, devo lembrar que na minha infância cansei de ouvir tias, vizinhas, todos, dizendo que a fulana tivera muita sorte, casara com um bom partido.

Por bom partido, aprendi depois, era um sujeito cobiçado pelas gurias porque o pai dele era dono de uma loja de sapatos. Ou trabalhava no cartório. Sem falar num exibido que trabalhava num banco. Era assim. Os rapazes - bons partidos - eram os que se deram bem... Ninguém jamais especulava sobre suas qualidades de bom filho, se honesto ou não, se trabalhador, se bom cristão, essas coisas, enfim, que transitam pelo caráter.

No caso dos médicos que se encontraram para a festa dos 20 anos, ninguém perguntou se o fulano, o ausente, era bom médico, dedicado aos pacientes, um cara que não desliga o celular no fim de semana, um sujeito que estuda "todos" os dias, que procura saber de novos métodos de tratamento ou cirurgia, não, nada disso. O que o pessoal quer saber é se tem dinheiro no banco.

Bom, se esse é o critério, tem muito vigarista rico, tem banqueiro que leva o banco e os acionistas à bancarrota e que está "soltinho" da Silva, em casa, com direitos concedidos por quem de "direito" (?). Vidinha safada essa de hoje. O bom caráter é um parvo, um burro, um desdenhado. O vigarista, o mau profissional, o trapaceiro, o enganador, vive, não raras vezes, cercado de cortesias e muitos até celebrados nos jornais. Bah! Casos de polícia. E só ter olhos de ver.

Vai mudar? Se vai mudar, leitora? Vai. Vai mudar no dia em que tivermos instrução, moral e cívica nos currículos, responsabilidade nos ombros, soubermos votar e escolher homens e mulheres que honrem o que vestem para chegar ao poder. O que vemos hoje não dá esperança. Enquanto isso, as sirigaitas vão continuar procurando por "bons partidos" e os doutores dizendo que os colegas estão bem, muito bem, afinal, moram em mansões e dirigem carros caros... Socorro.

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