domingo, 19 de agosto de 2007

Artigo

OS FUGITIVOS DO PARAÍSO
Percival Puggina


É perfeitamente possível que alguém reprove o regime imposto por Fidel a seu país sem ser democrata, mas o contrário é impossível: quem defende o regime cubano não é e não pode se declarar democrata. O que tal pessoa faz, na bruma das mistificações, é usar a peneira ideológica para escamotear o sórdido totalitarismo imposto pelo tirano.

Não se trata, aqui, de mera divergência entre esquerda e direita porque boa porção desse arco é compatível com a democracia. Há uma esquerda democrática, uma direita democrática, e ambas são politicamente naturais e necessárias. A questão cubana envolve um divisor de águas muito mais profundas, ou seja, o divisor que separa democracia de totalitarismo. Tal pauta, infelizmente, se estende bem além da Ilha, produzindo efeitos, por exemplo, na opinião pública de nosso país. É preciso ter consciência disso.

Defender o regime cubano é argumentar em favor do partido único, da supressão das liberdades públicas, da recusa a direitos humanos fundamentais, do estado policial, dos cárceres políticos, dos tribunais revolucionários. É defender a mais rigorosa censura à imprensa e a formação para o comunismo como dever constitucionalmente imposto às famílias e ao sistema de ensino. É admitir a invasão da privacidade dos lares pelo braço armado do Estado e zombar do sangue vertido nos “paredones” onde continuam sendo executados os inimigos do regime.

Estrangeiros, em Cuba, podem comprar carro, telefone celular, hospedar-se em qualquer hotel, ir às praias de Varadero, entrar e sair do país. Já os infelizes cubanos, cidadãos de segunda categoria em sua pátria, escravos de um Estado que se apropria da totalidade da renda nacional, não têm esses mesmos direitos.

O que aconteceu no Pan com aqueles valiosos atletas, cabresteados como gado para evitar debandada em massa, foi pequena amostra do controle que o estado cubano exerce sobre o povo. Tal situação se expressa em frase ouvida a boca pequena nas vielas de Havana: “Que culpa tengo yo de haver nacido en Cuba?”.

Nenhuma. O povo cubano é vítima inocente de um regime que o oprime há meio século. Esse regime tem apóstolos entre nós. E eu não posso deixar de apontar o quanto há de sinistro em saber que seus defensores participam da política brasileira sob o resguardo de uma democracia por cujas regras mínimas e valores máximos não têm a menor estima. “Mas a educação e a saúde cubanas são ótimas!”, alardeiam. Certa feita, admirando o pôr do sol no Malecón Habanero, puxei conversa com um casal de idosos e os inquiri sobre o tema. Disse-me a velhinha: “Temos a educação e a saúde mais caros do mundo, senhor, porque há décadas os pagamos com nossa fome e falta de liberdade”.

Não importa quantos debandem desse tal paraíso ou quantos morram antes de que a tal utopia se realize. Nem quantos morram em seu nome porque em seu nome tudo é permitido. Afirmar que as coisas são ao contrário de quanto pode ser percebido pelos cinco sentidos de qualquer ser vivo é a menor dessas licenciosidades. Em outras palavras: vá a Cuba e veja como mentem! E mentem para defender idéias que, experimentadas em diversos países de quatro continentes, ao longo de um século inteiro, não podem apresentar um único estadista, jamais geraram uma democracia e não produziram uma economia que se sustentasse. Até sua mentira é totalmente vã.

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