domingo, 12 de agosto de 2007

Máximas e Mínimas do Barão de Itararé (a última)

Eu tinha doze garrafas de uísque na minha adega e minha mulher me disse para despejar todas na pia, porque se não...

- Assim seja! Seja feita a vossa vontade, disse eu, humildemente. E comecei a desempenhar, com religiosa obediência, a minha ingrata tarefa.

Tirei a rolha da primeira garrafa è despejei o seu conteúdo na pia, com exceção de um copo, que bebi.

Extraí a rolha da segunda garrafa e procedi da mesma maneira, com exceção de um copo, que virei.

Arranquei a rolha da terceira garrafa e despejei o uísque na pia, com exceção de um copo, que empinei.

Puxei a pia da quarta rolha e despejei o copo na garrafa, que bebi.

Apanhei a quinta rolha da pia, despejei o copo no resto e bebi a garrafa, por exceção.

Agarrei o copo da sexta pia, puxei o uísque e bebi a garrafa, com exceção da rolha.

Tirei a rolha seguinte, despejei a pia dentro da gar­rafa, arrolhei o copo e bebi por exceção.

Quando esvaziei todas as garrafas, menos duas, que escondi atrás do banheiro, para lavar a boca amanhã cedo, resolvi conferir o serviço que tinha feito, de acordo com as ordens da minha mulher, a quem não gosto de contrariar, pelo mau gênio que tem.

Segurei então a casa com uma mão e com a outra contei direitinho as garrafas, rolhas, copos e pias, que eram exatamente trinta e nove. Quando a casa passou mais uma vez pela minha frente, aproveitei para recontar tudo e deu noventa e três, o que confere, já que todas as coisas no momento estão ao contrário.

Para maior segurança, vou conferir tudo mais uma vez, contando todas as pias, rolhas, banheiros, copos, casas e garrafas, menos aquelas duas que escondi e acho que não vão chegar até amanhã, porque estou com uma sede louca ...

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Apparício Torelli, Barão de Itararé, o Brando, (1895/1971), "campeão olímpico da paz", "marechal-almirante e brigadeiro do ar condicionado", "cantor lírico", "andarilho da liberdade", "cientista emérito", "político inquieto", "artista matemático, diplomata, poeta, pintor, romancista e bookmaker", como se definia, era gaúcho e é um dos maiores humoristas de todos os tempos. Dele disse Jorge Amado: "Mais que um pseudônimo, o Barão de Itararé foi um personagem vivo e atuante, uma espécie de Dom Quixote nacional, malandro, generoso, e gozador, a lutar contra as mazelas e os malfeitos".

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