segunda-feira, 18 de setembro de 2006

Artigo

CONVERSA COM GABEIRA
Rodrigo Constantino

“A população já descobriu que o PT é igual aos outros que ele denunciava.” (Fernando Gabeira)

Estive em uma pequena reunião informal com o deputado Fernando Gabeira, onde pude fazer perguntas diretas sobre diversos assuntos. Em um resumo geral, ficou a imagem otimista de que seres humanos podem evoluir com o tempo. Gabeira ainda defende muitas idéias que eu condeno, colocando demasiada fé na capacidade estatal de consertar problemas – muitas vezes criados pelo próprio Estado. Mas comparado ao Gabeira que sonhava o sonho comunista e que chegou a participar do seqüestro do embaixador americano, adotando a máxima de que os fins justificam os meios, o atual é infinitamente melhor, mais amadurecido e realista.

Gabeira tem sido uma voz firme na oposição a este governo de quadrilheiros, e lutado como pode contra o corporativismo do Congresso. Saiu do PT com forte desgosto pela incompetência, antes mesmo dos escândalos infindáveis de corrupção. Reconhece que há poder demais concentrado em Brasília, e que a divisão entre esquerdistas e direitistas não é mais a crucial, e sim a que separa os republicanos dos patrimonialistas. De um lado, os que pretendem fazer algo pelo bem público, e do outro os que entram na política para aumentar o patrimônio pessoal. Gabeira entende ainda que o poder corrompe, e que a ocasião ajuda a fazer o ladrão. Afirma que confia diretamente em cerca de 10% dos congressistas, mas que vários outros não necessariamente praticariam atos ilícitos, fossem as oportunidades para tanto reduzidas. E isso passa pela redução do dinheiro que trafega pelas mãos dos políticos, assim como o poder.

O deputado defendeu que os governos não mais tenham o direito de alterar boa parte do quadro de burocratas, colocando “companheiros” nos cargos importantes por critérios políticos e prejudicando o funcionamento da máquina, que deveria ser mais independente. Em vários aspectos, Gabeira agora espelha-se no modelo americano. Deixou os dogmas ideológicos de lado e partiu para o bom senso. Até mesmo na questão ambiental – bandeira antiga – entende que há pouca compreensão por parte do governo das necessidades de se levar em conta os investimentos produtivos, muitas vezes engavetados por critérios absurdos, colocando o crescimento econômico em risco. Gabeira entende que a competitividade das empresas brasileiras precisa melhorar urgentemente, posto que a globalização pode fazer muito bem para o país, caso bem explorada. Lembrou a metáfora do leão e do antílope, onde o leão precisa correr mais rápido que o antílope mais lento, enquanto que o antílope precisa correr mais rápido que o leão mais rápido. Não importa se você é leão ou antílope, o importante é acordar e começar a correr! Duro é fazer isso com uma bola de chumbo amarrada num pé – os impostos extorsivos, e outra no outro pé – a burocracia asfixiante.

Não foram poupadas críticas ao PT no bate-papo, tampouco aos membros da esquerda retrógrada, ainda adeptos do comunismo. Gabeira condenou veementemente a postura do governo sobre a questão de Cuba, por exemplo. Quando perguntado sobre ideologias, evitou um rótulo, mas acabou por se considerar um capitalista. Sobre a citação na epígrafe acima, não faz justiça ao que foi dito por Gabeira na conversa informal. Ele parece compreender que o PT, na verdade, não fez “mais do mesmo”, e sim algo bem pior, uma verdadeira tentativa de tomar o controle de toda a máquina estatal. O “mensalão”, por si só motivo suficiente para um impeachment, é apenas a ponta do iceberg. A quadrilha, nas palavras do procurador da República, tinha objetivos muito mais amplos que a compra de deputados.

O petit comité reunido para escutar as idéias de Gabeira foi útil para eu verificar, uma vez mais, que nem tudo está perdido. O jovem Gabeira representava tudo que eu combatia, e o novo Gabeira tem idéias bem mais sensatas e racionais. Não foi suficiente para a conquista do meu voto, é verdade. Ainda tenho muitas divergências em relação ao papel que Gabeira atribui ao Estado na construção de um país mais livre e justo. Mas como já disse, perto do que ele defendia no passado, atualmente estaria inclinado a considerar Gabeira quase um aliado liberal. Quem sabe com mais alguns anos – e novas decepções com o Estado – ele não chega lá!

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