terça-feira, 16 de maio de 2006

Editorial - O Globo - 08/05/2006


Filas eternas

Entre as promessas não cumpridas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a seu eleitorado — e por extensão aos brasileiros em geral — está o fim das filas no INSS. E entre as declarações mais infelizes do seu governo está a do ministro da Previdência, Nelson Machado, de que uma das dificuldades para acabar com as filas, ou reduzi-las a dimensões menos humilhantes, é uma espécie de resistência cultural dos brasileiros.

Agilizar o atendimento, segundo o presidente Lula, estaria dentro de um plano geral do seu governo para dar dignidade aos cidadãos. Até data ele estabeleceu para o fim da tortura a que multidões de brasileiros são submetidos diariamente diante dos postos do INSS país afora. “A partir de março, começo de abril,” disse Lula no fim do ano passado. “Podem me cobrar.”
O presidente não precisava ter fixado prazo tão curto. Seria impossível eliminar em tão pouco tempo uma das mais antigas mazelas do serviço público — o mau atendimento. O resultado prático da declaração de Lula foi torná-lo refém da própria palavra.

O ministro da Previdência também tem sido pouco inspirado nas explicações e sugestões. Sua recomendação para que as pessoas procurem ir às agências à tarde, e não de manhã, não resiste ao teste mais simples: como se sabe, muitos postos deixam de atender mais cedo do que deveriam.

Numa conversa com repórteres que lhe recordaram a promessa presidencial, o ministro tentou explicar, didaticamente, que as filas são uma forma de organizar o processo de trabalho, citando o exemplo das filas de cinema, que nunca deixarão de existir.

Obviamente, não é esse o sentido da cobrança. Ninguém pede ao governo que acabe com a fila como instituição. O que se espera é que, com a racionalização do atendimento e a diminuição da burocracia, as filas do INSS andem pelo menos tão depressa como as dos cinemas. E que ninguém precise acordar de madrugada, ou dormir na fila, para receber uma senha — e ser mandado para outra fila.

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